A ministra da Saúde, Nísia Trindade, afirmou, em entrevista exclusiva ao JOTA, que as propostas apresentadas na PEC do Plasma colocam em risco a segurança do sangue no país. Não apenas da qualidade, mas da disponibilidade do produto para pessoas que precisam de transfusões ou de hemoderivados.
Nísia disse que o governo considera desnecessária a proposta de emenda constitucional, prevista para ser votada nesta quarta-feira (4/10), na Comissão de Constituição e Justiça do Senado.
“Eu não faço nenhuma previsão. Eu só torço, torço para que não haja uma aprovação da Comissão de Constituição e Justiça porque, ao meu ver, essa PEC fere um direito fundamental que a Constituição de hoje nos assegurou. E não só isso. Hoje, nós temos um contexto que permite que o Brasil tenha algo que muitos países não têm, que é a autossuficiência em hemoderivados”, afirmou a ministra.
Os entendimentos estão sendo feitos por meio do líder do governo no Senado, Jaques Wagner. Nísia afirmou que o governo, de forma geral, está aberto ao diálogo com os parlamentares. “Possibilidade de entendimento sempre há, ainda mais em um governo que está defendendo o diálogo em todas as pautas legislativas”.
A ministra, contudo, afirma que em alguns pontos não é possível fazer concessões. “Não é possível fazer uma coleta de plasma separada, uma coleta de sangue de forma privada”, disse.
A PEC prevê a possibilidade, hoje inexistente, de a iniciativa privada participar do processamento de sangue no país. Uma das justificativas para essa medida seria o desperdício da coleta de sangue pela hemorrede. A proposta abre ainda a possibilidade de uma recompensa para pessoas que fizerem a doação de sangue. A sugestão é feita em um momento em que a Hemobrás, empresa encarregada da produção de hemoderivados no país, depois de muitos atrasos, está próxima de iniciar a produção de Fator VIII e, numa segunda etapa, de albumina e imunoglobulina.
A percepção é de que, caso a PEC seja aprovada, todo investimento realizado na Hemobrás seja desperdiçado. Mais ainda, que haja insegurança na obtenção de hemoderivados no país.
Nísia Trindade pondera que, no momento em que a PEC foi apresentada, ano passado, não havia uma intenção clara do governo de se investir na política nacional de sangue. Algo que, garante, mudou a partir de 2023. Ela observa haver linha de investimentos tanto na Hemobrás quanto na Hemorrede, prevista no Novo PAC. “Estamos em um outro momento. Um momento em que o governo vai acolher a ideia inicial da Hemobrás, que é garantir a autossuficiência”
A ministra lembrou ainda que hoje há segurança no sangue coletado e doado, graças a um sistema de controle. “E isso não é pouca coisa”, disse, referindo-se ao período anterior à Constituição Federal, em que sangue podia ser comercializado e não havia segurança na coleta. “Se você tem um processo desvinculado do Sistema Único de Saúde, nós não podemos mais aferir essa qualidade da forma como fazemos”
A ministra ressaltou ainda que, justamente por isso, o Ministério da Defesa passou a considerar a Hemobrás como uma empresa de segurança nacional. “Não podemos ficar à mercê de interesses comerciais quando se trata de sangue e hemoderivados”
Nísia rebateu, ainda a ideia de que há desperdício de plasma. “A principal finalidade da transfusão de sangue no Brasil é salvar as vidas das pessoas que precisam dessa transfusão”. E isso, completa, é atingido. O fracionamento de sangue em seus componentes também é realizado. “Com o fortalecimento da Hemobrás seremos capazes de processar 80% do plasma necessário para o uso de um derivado no Brasil”
A exemplo de outros especialistas, Nísia alerta que, caso a PEC seja aprovada, haverá um risco de o plasma coletado ser remetido para o exterior e não retornar, aumentando problemas de abastecimento. “Seria uma situação de vulnerabilidade como vivemos durante a pandemia de Covid-19.”
Nísia Trindade disse esperar que o tema não seja aprovado na CCJ do Senado. Caso, contudo, isso venha a acontecer, o trabalho de convencimento para que o texto não avance continuará. “Essa é uma posição de governo. Vamos estar dialogando para as próximas etapas de votação”. (FONTE: JOTA SAUDE)
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