Reportagem do jornalO Estado de S.Paulodesta segunda-feira (24) destacou que, entre março e junho, quatro primeiros meses da pandemia do novo coronavírus, o Brasil fez cerca de 388 mil cirurgias eletivas (não urgentes) a menos no SUS, conforme dados do Ministério da Saúde, na comparação com a média dos cinco anos anteriores. A queda é de 61,4%. Com a flexibilização do isolamento social na maior parte do País e a retomada das operações, profissionais de saúde preveem alta expressiva da demanda. Dentre as especialidades que mais preocupam, estão as cirurgias oncológicas, cardiovasculares e psiquiátricas, pela imprevisibilidade de evolução dos quadros, o que demandaria acompanhamento recorrente e rigoroso. “Mesmo sendo eletivas, algumas cirurgias não podem esperar eternamente. A situação já era difícil antes da pandemia. Essa questão ficou ainda mais clara”, diz Cintra, da FGV. Trabalhando voluntariamente na interseção entre gestores da saúde pública e profissionais na linha de frente do combate à covid, Maira Caleffi, presidente da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama, também diz que a tendência é de que a defasagem do SUS para cirurgias eletivas se agrave, caso não haja coordenação eficiente das demandas. “Esses atrasos vão aumentar a demanda em áreas onde o SUS é muito deficitário, como câncer avançado, transplantes de órgãos, diálise.” Em algumas áreas, como urologia e cirurgias abdominais, a estimativa é de que até 80% dos procedimentos tenham sido interrompidos. E, de acordo com Maira, o paciente crônico é um ponto crítico. “Parece que, com essas ondas como zika, dengue e coronavírus, você nunca chega a lidar com o paciente crônico. Ele nunca tem o cuidado que merece do sistema público de saúde. Segue aos trancos e barrancos, às vezes sem saber sequer para qual médico ir", acrescenta ela. “Essa é uma preocupação muito grande porque as outras doenças não pararam de crescer. Os dados de mortalidade mostram que houve muitos óbitos de covid e também de outras doenças, muito provavelmente pela dificuldade de acesso nesse período”, aponta Daniel Soranz, professor da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz. Para Angelo Vattimo, coloproctologista e primeiro secretário do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), a solução não se resume a um só tipo de incremento na rede hospitalar. “O grande problema é o acesso, que já não era ilimitado. Não adianta aumentar leitos sem a infraestrutura necessária para que sejam resolutivos.” Para retomar cirurgias, medidas de distanciamento e higiene também devem entrar no planejamento. “Ir ao hospital para tratar algo e voltar com covid-19 não é uma situação que queremos”, destaca Walter Cintra, da FGV. O consenso entre representantes de hospitais, especialistas em gestão de saúde e membros da comunidade médica é de que as cirurgias eletivas vão aumentar a demanda pelo trabalho articulado entre equipes. Dentre as estratégias possíveis, são defendidas reclassificação individual de casos, uma “força-tarefa” dos médicos e mais investimento no setor, que luta para driblar problemas estruturais.
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